Escrevo esse texto profundamente emocionado. Poucas vezes escrevo sob forte impacto emocional. Palavras escritas na web configuram-se como um registro duradouro (talvez eterno) e pensar um pouco antes de escrever é sempre de bom alvitre. No entanto, a abordagem feita pelo Ronda do Quarteirão em que um soldado atira em um adolescente que estava na garupa da moto de seu pai é trágica demais. Não dá para esperar o sangue esfriar. Impossível ficarmos insensíveis. Não consigo deixar de pensar na dor da família, em especial na do pai que presenciou tudo. Vi na televisão que ele ficou abraçado ao corpo do filho.
Embora esteja consternado não se trata aqui de falar sobre algo pontual e motivado somente pela tragédia. Em outubro de 2007, discorria, aqui mesmo no blog, sobre os fundamentos da qualificação policial. Na época, uma outra abordagem desastrada havia ocorrido. Na verdade, tenho escrito recorrentemente sobre o perigo que foi e que continua sendo a colocação de policiais na rua sem a devida qualificação. Repito o que já cansei de dizer: polícia despreparada potencializa a violência. Recentemente escrevi sobre como a carga horária de mais de 1000 horas não pode ser dada em períodos tão curtos como os que vêm sendo adotados aqui no Estado. A absorção de conhecimento é baixíssima. O que dizer de uma turma enorme de cerca de 2000 pessoas? Como fazer treinamento prático? Como fazer acompanhamento em campo? Como padronizar procedimentos?
Esse semana descobri outra coisa que me deixou ainda mais preocupado com o futuro da Segurança Pública no Estado. Com a demolição da Academia de Polícia Edgar Facó, a Policia Militar não pôde manter os cursos de formação. Isso acarretou uma descontinuidade no processo de formação de oficiais que são os gerentes do contingente operacional. Os soldados do ronda, por exemplo, precisam ser acompanhados por tenentes, capitães e majores nas suas atividades diárias de polícia preventiva.
Para quem, como eu, acredita que os maiores problemas da Segurança Pública são formação de pessoal e gestão, tem muito motivo para se preocupar.
4 comentários:
Vasco,
Lembro de nossos debates em 2008/2009 sobre o Programa Ronda do Quateirão. Eu muito satisfeito com a visível presença de veículos e policias da PM nas ruas e você muito cético sobre o programa.
Os problemas parece que apareceram antes do que eu imaginava. Porém, gostaria de fazer uma ressalva: este fato ocorrido no domingo passado pode ser caracterizado como a falta de preparo ? Não seria um enorme acidente ocasionado por um ser humano?
Luis Eduardo
Vasco
Acho que a questão de formação dos policiais merece ser tema de linhas de pesquisa acadêmica em escolas de Educação, Administração Pública, Ciência Política etc.
Há algum embrião de movimento no sentido de um processo sistemático de avaliação da qualidade dessa formação? Eis um espaço para criação de observatórios, indicadores etc. A propósito, li hoje no Estadão uma matéria sobre avaliação do impacto de Parcerias de Empresas sobre os resultados no ENEM. Não é um paralelo interessante?
PS.: você é um blogueiro excepcional!
Um grande abraço
Sérgio Storch
Caro Sérgio,
Seu comentário é muito apropriado. Creio muito mais na avaliação externa feita pela população do que aquelas feitas por instituições governamentais que tendem ao corporativismo exagerado.
Abco,
Vasco
Caro Luis,
QUe foi um acidente, não tenho dúvida. Mas causado por uma falha enorme na postura básica que deveria ter sido exaustivamente treinada. Sabemos que não é esse o caso. Infelizmente, só uma tragédia assim faz-nos acordar para as nossas deficiências. Aliás, ainda espero que pelo mesos isso seja conseguido. Temo que um tempo faça-nos esquecer e tudo fique como está.
Vasco
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