O caso da criança que participou da abordagem à empresária Marcela Montenegro e que acabou por tirar-lhe a vida é emblemático do que considero o maior fracasso da nossa sociedade. O menino tinha onze anos na época em que deitou-se frente ao carro em movimento da empresária com o intuito de fazer-lhe parar e ser alvo de um ataque de jovens que visavam roubar-lhe.
Depois do crime, foi conduzido ao abrigo mantido pela Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social. Quase um ano depois o menino volta a cometer crime, justamente ao participar do mesmo tipo de abordagem. É inadmissível que o Estado não consiga cuidar de uma criança de onze anos de idade! Mais inadmissível ainda é usar o argumento de que a não há mais como recuperá-la. Barbaridade! Se não conseguirmos avançar nessa direção, como poderemos nos vangloriar de sermos maior economia disso e daquilo?
Mesmo se esse caso fosse uma infeliz exceção, o que lamentavelmente não acredito ser o caso, ele é trágico demais para ser desconsiderado. A incompetência demonstrada nas questões da deliquencia de crianças e adolescentes tem as consequencias graves evidenciadas no caso Marcela Montenegro, mas não param aí.
Outra conseqüência é que cresce nas pessoas o sentimento de que é preciso mais repressão, as leis são brandas e por isso a impunidade reina. Esse sentimento, embora me pareça justificável face a desesperança que impera, não pode prevalecer. As pessoas de bem precisam compreender e acreditar que a solução não está na busca da repressão, nem muito menos na modificação do arcabouço legal com esse fim.
Na verdade, se olharmos a realidade atual de boa parte das instituições responsáveis pela correção e punição de infratores, sejam crianças, adolescentes ou mesmo adultos, não é difícil perceber que ainda impera uma prática de alta repressão, violência e mesmo barbárie. Se alguém tem dúvida, basta ir a um presídio ou xadrez de delegacia lotado. O sistema policial e penal é recorrentemente foco de denúncias de violência e desrespeito dos direitos das pessoas. O que é isso, senão a prevalência de uma lógica repressiva e que aumenta o ciclo vicioso da violência? E isso não tem resolvido e não vai resolver. Infelizmente, vemos fragilidades similares ou mesmo maiores nas instituições responsáveis por dar assistência e alternativas de vida as crianças e adolescentes que necessitam de apoio.
Quantos de nós que clama por mais rigor no tratamento de jovens, tem coragem de fazer o mesmo com seus próprios filhos? Não o fazemos porque sabemos muito bem que a violência, antes de gerar obediência, gera mesmo é a revolta e o ódio. Vejam que não estou aqui a olhar a questão sob a ótica da fraternidade ou da bondade humana que, aliás, a população brasileira sendo tão religiosa, deveria até olhar. Defendo esse ponto de vista por convicção pragmática: é a única solução. Temos que prevenir, tratar, dar assistência, apoiar os que necessitam. Mas temos que fazer isso com qualidade. Hoje, só fazemos de conta. A sociedade como um todo tem que ser chamada a participar dessa grande e grandiosa tarefa. Se assim o fizermos, até a tarefa punitiva será mais fácil. Sobrará para aqueles que realmente não tem como serem reinseridos na sociedade. Mas não será nenhuma criança de onze anos de idade.
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