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quinta-feira, 16 de junho de 2011

Por Gorjetas de 15%. Opcionais.

Já foram algumas as minhas idas aos EUA. Negócios e passeios se somam ao ano de vivência durante o pós-doutorado. Nelas, durante e depois, vejo-me sempre a pensar sobre semelhanças e diferenças entre as sociedades. Nos dias atuais, nos quais cada vez mais o brasileiro tem a capacidade de conhecer os EUA in loco, pergunto-me se conseguiremos nos influenciar pelo o que há de positivo por lá ou só vamos conseguir contaminarmos pelo vírus do consumo exagerado que por lá tanto circula?

Uma das coisas que mais considero positiva na sociedade americana é que ela é eminentemente meritocrática. Isso é um pilar importante dentro de uma sociedade competitiva. Eles acreditam que se forem bons e fizerem a coisa certa (do the right thing), vão sobressair-se. O apadrinhamento, os laços de amizade e os laços familiares têm muito menos relevância do que cá por estas bandas.   

Um exemplo emblemático de como esse valor pelo mérito é exercitado pela sociedade é a forma como as gorjetas são dadas aos prestadores de serviço. Primeiramente, elas não são dadas somente a garçons em restaurantes. Motoristas de táxi, carregadores de mala e camareiras também podem recebe-las. Agora, o mais importante, é que são opcionais. Nada de incluí-las obrigatoriamente no serviço. Recebe quem merece (e recebe mesmo, não fica com o proprietário). Convencionou-se que um serviço prestado corretamente merece 15%. Uma qualidade superior ao esperado pode valer gorjeta de até 20%.

As gorjetas opcionais servem para exemplificar um outro valor fundamental e que também é sustentáculo da sociedade americana. O rei na sociedade de consumo é o cliente. Dar-lhe atenção e prestar-lhe bom serviço é essencial e não deve ficar só em conversa. Pesa no bolso. Isso não se restringe ao atendente na ponta, mas ao sistema todo. Uma vez, ao sentar-me à mesa em um restaurante, havia um garfo sujo entre o talher que me foi disposto. Solicitei à garçonete que o trocasse. Ela não só o fez de pronto, mas ainda comunicou ao gerente (creio que teve receio de não ter seu serviço bem avaliado) que veio gentilmente pedir-me desculpas e oferecer-me um tira-gosto como cortesia. Será que presenciaria isso aqui onde os 10% independem da qualidade do serviço prestado?

Nesse momento em que temos discutido sobre nossa vocação turística em especial  como preparação para o Copa de 2014, que tal implementarmos ações que tornem melhores prestadores de serviço? O exemplo americano, nesse caso, acho que poderia ser de bom alvitres. 


* esse artigo foi publicado na coluna Opinião do Jornal OPovo de 13/06/2011

2 comentários:

Vasco Furtado disse...

Caro Vasco,

Li seu artigo de hoje, como sempre faço com seus textos publicados no O POVO. Mas, é o seguinte: a gorjeta nos EUA, mesmo "opcional", se v. não a der, será olhado tipo assim um cão danado: ou me engano? Ou seja, de opcional, torna-se obrigatória, já que todos acham que fazem o seu serviço "corretamente".

Vou lhe contar uma experiência única, que passei no Pão de Açúcar (da Júlio Ventura). Quando o rapaz levou minhas compras ao carro, dei-lhe a famosa moeda de um real [calculava um dólar para essas gorjetas, mas quando acabou a equivalência não fiz a correção :(, mas preciso fazê-la]. O rapaz recusou-se educadamente e disse: "Não é preciso, eu já ganho para fazer esse trabalho". Eu insisti um pouco, meio sem graça, mas ele não aceitou. A propósito, é cada vez menor o número de empacotadores nas lojas do nosso amigo Abílio Diniz: ele deve achar que está lucrando pouco e cortando funcionários.

Abraço,
Plínio Bortolotti

Vasco Furtado disse...

Caro Plínio
Obrigado pelo seu comentário.Ele é corretíssimo. Na verdade, essa pressão da sociedade para que a gorgeta seja dada é necessária para que o sistema funcione. Afinal, se não fosse assim os prestadores de serviço se desmotivariam, pois não teriam certeza de que seriam recompensados. E uma coisa que os americanos decidamente não gostam de fazer é trabalhar de graça. O que é relevante é que o cliente tem o poder de decidir. Se o serviço não for bom ele não dá nada e ponto final.