No texto anterior desse blog, descrevi um estudo feito por pesquisadores europeus e americanos que põe em dúvida a validade de se realizar detecção precoce de câncer de próstata com as técnicas que a medicina hoje domina. Mencionei o quanto me surpreende a reação de colegas quando são expostos aos resultados. Vou explorar esse aspecto aqui. Primeiramente, percebo que não é fácil entender que o conhecimento humano tem limites e que podemos estar atualmente sendo vítima dessa limitação. Temos nos acostumado a viver numa sociedade vencedora constantemente de desafios científicos e tecnológicos e assim custamos a aceitar que muitos dos procedimentos que fazemos hoje são pautados somente pelo que conhecemos até então. Amanhã (e esse amanhã se apresenta cada vez em intervalos de tempo menores) poderemos reconhecer que estávamos errados e que devemos agir outramente. Na medicina isso é muito marcante. Aliás, a nossa sociedade insere brusca e abundantemente todo um novo conjunto de materiais que são ingeridos (i.e. transgênicos), utilizados (i.e. celulares), respirados (i.e. CO2 e gases diversos), etc. que podem nos estar matando e que os estudos da medicina não foram capazes de detectar os malefícios causados. Evidentemente que isso não nos deve por em pânicos. Não tem muito sentido também, um paciente viver a desconfiar do conhecimento do médico que ele consultou sob o argumento de que aquele conhecimento é limitado e que algo diferente pode aparecer. No entanto, é importante saber que aquele conhecimento (normalmente vindo das universidades) deve ser constantemente confrontado com as novas pesquisas que diariamente trazem diferentes prismas sob o que está posto. Em poucas áreas do desenvolvimento humano a interação entre o profissional que aplica o conhecimento existente e aqueles que avançam esse conhecimento se faz tão premente como na área de saúde. Seria interessante se pudéssemos considerar isso na escolha de nossos médicos.
Outro aspecto interessantíssimo da reação das pessoas quanto ao estudo supramencionado é de que elas relacionam logo qualquer observação crítica à realização dos testes de detecção com sendo uma resistência machista ao exame de toque retal. As campanhas de “conscientização” são tão intensas que falar contra é politicamente incorreto. Aqui vale a compreensão que decisões sobre o que deve ou não compor uma política pública de saúde são baseadas em uma alguns fatores que podem extrapolar o mero interesse de que as pessoas vivam melhor. Por exemplo, na França, qualquer pessoa que sofre um acidente ortopédico de maior monta (quebrar um tornozelo, por exemplo) e que precise colocar gesso deve tomar injeções diárias enquanto tiver com o gesso com substâncias que evitam embolias causadas por coágulos que podem se formar em função da imobilização. Isso é realmente necessário? Não sei. Agora o que sei é que no Brasil não fazemos o mesmo e não é porque ninguém tenha sofrido um problema desse por aqui. Trata-se de uma questão de custo vs benefício. Por enquanto o Brasil continua achando que vale a pena realizar os testes e as cirurgias de extração das próstatas para salvar vidas. Recentemente um urologista brasileiro teve a coragem de levantar a dúvida sobre a validade dessa política, mas foi execrado. Se essa política deve persistir, o futuro dirá, mas é importante que saibamos que se assim o for, não deve ser por fatores externos como lobbies de setores médicos ou interesses comerciais desse ou daquele setor. Deve ser por força do conhecimento humano naquele momento (mesmo que limitado).
2 comentários:
Tenho 41 anos, devo fazer o exame da próstata? Você faria ?
Caro Anônimo,
Não tenho a menor condição de responder a primeira parte de sua pergunta. Creio ser uma decisão muito pessoal. Para a segunda pergunta basta dizer-lhe que tenho mais de 41 e ainda não fiz o exame.
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