Senti-me impelido a falar, nessa época de aniversário meu e de Fortaleza, da relação que tenho com a cidade e de um dos sentimentos que ela me desperta. Nasci aqui e embora tenha vivido cerca de 20% de minha vida fora, sempre estou de volta. Não consigo, no entanto, deixar de compara-la com os locais onde passo. O que temos de atrativo?
Cresci numa Fortaleza, não tão pacata quanto a de meus pais. Passei a explorá-la e conhecê-la por conta própria na década de 70. À época, Fortaleza estava em crescimento como eu. Parece-me que havia (e ainda há) no nosso imaginário de fortalezense, uma necessidade constante de torná-la uma grande metrópole. E assim aconteceu. Infelizmente esse crescimento se deu de forma totalmente dissociada de uma reflexão mais ampla sobre que tipo de crescimento deveríamos ter.
Uma das poucas coisas que, nos últimos quarenta anos, se aproxima de um planejamento a longo prazo para a cidade foi a unanimidade em torno de nossa vocação ao turismo. Uma ideia que independeu de partido político no poder, mas que aqui também parece se desenvolver de forma desfocada, sem a completa percepção do que realmente devemos fazer para sermos atrativos.
Não me parece que percebemos que o mundo hoje quer ardorosamente consumir cultura (em sentido amplo que o conceito representa). Esse é o objeto de desejo dos que viajam. Querem conhecer, dentre outras coisas, arte, sabores, costumes, produtos, vegetação, gente, enfim, um ecossistema cultural que quanto mais rico mais atrativo. As pessoas querem sentir uma cidade e alimentar seus sentidos. Infelizmente, ser atrativo aos turistas por este ponto de vista requer um dever de casa que não estamos fazendo a contento: investir muito em cultura.
O pior é que não percebemos que a forma de crescimento que adotamos consegue inclusive a ser depredadora do que possuímos. Destruímos cada vez mais nossos espaços típicos, como pequenas vilas residenciais, áreas verdes urbanas e ruas rústicas de paralelepípedo. Privilegiamos os grandes empreendimentos a nossos artistas, cozinheiros e empreendedores da cultura enfraquecendo a economia criativa local. Desvalorizamos nossa história que, embora jovem, é essencial para compreendermos o que somos e porque assim estamos.
Ainda estamos tão ávidos por consumir a cultura de “fora” que deixamos a preservação e fortalecimento da nossa em segundo plano. E assim vamos crescendo.
* artigo reproduzido hoje na coluna Opinião do Jornal O Povo
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