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sábado, 19 de maio de 2012

As Belas Calçadas de Fortaleza (Cont)


Volto ao tema das belas calçadas de Fortaleza. Comecei a discorrer sobre o mesmo semanas atrás, depois de ter lido uma matéria do jornal O Povo sobre uma pesquisa feita pelo Mobilize Brasil. Nela algumas  calçadas de Fortaleza são consideradas pelos entrevistados como as melhores do Brasil.

A pesquisa foi feita por uma OSCIP(Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), fundada em 2003, e que atua nas áreas de educação, cultura e cidadania, chamada Associação Abaporu, organização sem fins lucrativos que lançou o projeto Mobilize Brasil. Não pude conseguir maiores detalhes sobre a OSCIP.

Concluir que Fortaleza tem as melhores calçadas do País é um contra-senso tão grande que logo a notícia virou piada nas redes sociais. Achei que a estória ia parar por aí mesmo, mas quando li o artigo da prefeita Luizianne Lins se vangloriando das calçadas da cidade e usando a pesquisa em questão, decidi escrever ao portal Mobilize Brasil para pedir maiores informações. Passados 15 dias, as respostas não vieram. Estimo que não virão e por isso decidi escrever o que penso independentemente das mesmas.

Não se pode lançar mão de informações feitas em pesquisas de opinião sem a mínima preocupação em compreender a forma como elas foram realizadas, pois isso vai impactar nas conclusões que podem ser tiradas. Infelizmente isso não faz parte da prática jornalística da maioria da mídia cearense. Reconheço que isso dificulta sobremaneira o trabalho e muitas vezes os meandros desse mundo, por mais que questionados, não são totalmente desvendados. Mas na maioria das vezes, não se precisa de muito detalhe.

Voltemos à questão das calçadas e foquemos primeiramente em um aspecto: o da escolha de que calçada será o alvo da pesquisa de opinião com os cidadãos. Trata-se de uma variável fundamental. Uma metodologia seria pegar o total de ruas da cidade e sortear aquela a ser investigada. Isto daria uma visão mais neutra da qualidade das calçadas independentemente de qualquer critério e a deixaria livre de um “bias” (termo em inglês comumente usado para dizer que a pesquisa está viciada). Assim, supondo que Fortaleza tem em torno de 50.000 ruas, a probabilidade de escolher a Bezerra de Menezes (rua que acabou de sofrer serviços de reparação da prefeitura) seria de 1 em 50.000. Pois não é que a Bezerra foi justamente uma das ruas investigadas ! Muita sorte da prefeitura, não (azar o nosso)?

Outra variável importante é a quantidade de calçadas a serem pesquisadas. Qual o valor que pode ser considerado significativo para que, ao final da pesquisa, possa-se dizer com algum grau de certeza de que os resultados referem-se à cidade em geral? Não vou entrar em detalhes das técnicas estatísticas que podem ser usadas, mas não precisa ser especialista para perceber que uma pesquisa feita em 7 ruas não parece ser muito representativa das 50.000 que compõem o total. O mesmo tipo de raciocínio se aplica à quantidade de pessoas que responderam às perguntas, a forma como elas estavas escritas, a ordem das perguntas, etc. etc.

O mais interessante disso tudo foi o artigo da prefeita Luzianne logo em seguida o lançamento da matéria. Ela aproveitou a onda, mas foi bem mais inteligente do que poderíamos esperar. Compreensível! Ela já tinha cometido uma gafe horrível que apontei aqui quando vangloriou-se em cima de um estudo errado. Ao ler o título do artigo, cheguei a pensar, que ela iria cometer o mesmo erro de novo. Mas, não. Desta vez ela disse em seu artigo em resumo que a pesquisa feita nas calçadas que a Prefeitura tinha acabado de renovar, indicavam que a decisão tinha sido correta e que o trabalho havia sido bem feito. Disso não discordo e é a única conclusão válida que a pesquisa do Mobilize Brasil pode dar. Agora se a pesquisa não tivesse bias, ela permitiria verificar o quanto em termos percentuais da cidade esse tipo de iniciativa foi feito em 8 anos de gestão. Será que a prefeita teria motivado para se vangloriar e achar efetiva sua política de renovação urbana?

Enfim, o que devemos fazer, nós cidadãos “superinformados",  é estar muito atentos com o que nos é apresentado hoje em dia. Vivemos  na época do excesso de informação que flui a velocidade descomunal e trafega com intensidade global. Isso torna cada vez mais exigente nossa postura ao consumi-la. Por outro lado, aos meios de comunicação, espera-se ainda mais rigor nesse processo de curadoria. Será um fator decisivo para a sobrevivência dos mesmos. Afinal de contas repassar informação sem digeri-la está a um RT de todos nós.

Um comentário:

Windson Mateus disse...

Como muitas vezes acontece, infelizmente. Uma mentira contada várias vezes acaba por se tornar uma verdade...