O jornalista americano Thomas Friedman costuma escrever
sobre o fenomenal processo de crescimento das classes médias de países como
Índia, China e Brasil. Em especial, ele enfatiza que o que mais vai marcar o
futuro global é a busca dessa nova classe por direitos que antes não eram nem
percebidos. Quando o básico como alimentação, moradia e trabalho é satisfeito,
vem o interesse por outros valores mais, digamos, sofisticados.
Durante o carnaval, em que decidi passar em Paracuru, não
pude deixar de pensar sobre o que diz Friedman. Lembrei-me ainda de que,
atrelado à exigência de direitos, há naturalmente a percepção de deveres e de
respeito ao direito dos outros. Fiquei me questionando quando os que se
dirigiram àquela cidade vão considerar importante o direito ao silêncio. O
barulho infernal no espaço público durante vinte quatro horas ao dia alimentado
por paredões de som, com omissão beirando conivência do poder público, foi um
espetáculo deprimente.
Presenciei cenas, que depois amigos disseram-me se
reproduzir em várias cidades praianas, quase que surreais. Paredões de som
dispostos à pequena distância provocavam uma mixagem absurda e que não permitia
nem distinções de que música estava a tocar. Uma competição grotesca que saía
desfilando pela cidade e incomodando aos que estavam a quilômetros de
distância.
Espero que o exemplo de Fortaleza, onde uma legislação
específica para coibir esses excessos foi criada, possa chegar logo às pequenas
cidades. Não tenho dúvida que há espaço para promover uma festa rica e única
como o carnaval, mas onde prepondere o respeito ao direito das pessoas. Mas
para que isso aconteça, a população precisa perceber seus direitos e
consequentemente seus deveres.
Paredões e outras paredes de incivilidade precisam ser
derrubados. Poderíamos até leiloar pedaços desses paredões como procederam
europeus com cada tijolo do muro de Berlim. São paredes do subdesenvolvimento
que precisam ser destruídas exemplarmente. Que a nova classe média chegue logo
a exigir esse direito. Talvez assim o poder público aja em busca do bem estar
da coletividade.
Artigo publicado na coluna Opinião do O Povo de ontem
3 comentários:
O pensamento é perfeito e foi muito bem escrito. Mas, comento como uma pessoa que reside em um lugar análogo e que vivencia o mesmo tipo de intolerância. É uma coisa cultural, profundamente arraigada na ignorante cultura da exponenciação humana (principalmente a masculina), calcada, nestes lugares, sobremaneira, na possibilidade financeira de se sobressair com estes malditos equipamentos. Sentir repulsa pelo o que lhe é desagradável é compreensível; mas é utópico imaginar pessoas alienadas se desfazendo daquilo que as sustentam como criaturas.
Não sou tão cético Adauto. Teremos cada vez menos pessoas alienadas, espero.
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